15 de nov. de 2011

Cordel: Folhas volantes

Fonte: Diário do Nordeste (Fortaleza). Data: 14/11/2011.
URL: http://diariodonordeste.globo.com/materia.asp?codigo=1069882
Com um acervo de menos de 2 mil exemplares de literatura de cordel, a Biblioteca Nacional faz campanha para divulgar aos cordelistas a Lei do Depósito Legal, que obriga a doação de toda publicação em território nacional ao acervo da entidade, com o objetivo de perpetuar o escrito
A Universidade do Novo México possui um acervo de 4,6 mil exemplares do folheto que é a expressão mais tradicional da literatura popular do nordeste brasileiro: o cordel. A Biblioteca do Congresso Nacional dos Estados Unidos, em Washington, um número ainda mais robusto, com cerca de 9 mil títulos. No Brasil, uma surpresa ruim: a coleção da instituição que deveria traçar um panorama fiel de tudo que é produzido em território nacional, a Biblioteca Nacional (BN), resguarda um pífio acervo - conta com menos de 2 mil publicações.
Na tentativa de sanar essa alarmante deficiência, a entidade dá início à uma campanha de divulgação da lei que torna obrigatório aos autores a doação ao seu acervo de pelo menos um exemplar de cada obra publicada no País. Regulamentado sob as leis federais número 10.994 e 12.192, o chamado Depósito Legal prevê a doação de livros, jornais, discos, DVDs musicais e até catálogos de exposições e livros virtuais (e-books).
"A lei institui uma multa, mas a gente tem uma política de bom relacionamento com editores e autores", alerta a chefe da Divisão de Depósito Legal da Biblioteca Nacional, Daniele del Giudice. E dentro deste contexto, está também o cordel, muito embora nem autores, nem editores costumem saber disso. 
Como o acervo que depende destas doações, a Biblioteca acaba não conseguindo cumprir o seu papel de guardiã desta produção. "A literatura de cordel está parada (no setor de Depósito Legal da biblioteca). Esse mês de outubro, nós recebemos apenas oito exemplares do Brasil inteiro", atesta.
Ela explica que a postura da entidade é de buscar conscientizar os autores da importância dessa doação. "Por isso, a grande divulgação que queremos fazer no Norte e Nordeste, que é onde está a maioria dos produtores", justifica. A ideia é divulgar a lei e sua abrangência ao cordel por meio da imprensa preparando terreno para, em 2012, uma comissão da entidade correr feiras e bienais com material informativo.
Acervos particulares
Os dados sobre os acervos citados no início da matéria foram retirados de um levantamento feito pela Academia Brasileira de Literatura de Cordel (ABLC), localizada no Rio de Janeiro. O presidente da entidade, Gonçalo Ferreira da Silva, considera difícil mobilizar autores de cordel a enviar cópias de suas publicações à Biblioteca. "Os 40 cordelistas membros da ABLC encaminham para a academia suas publicações e, normalmente, 10 exemplares de cada. A gente re-encaminha para a Biblioteca Nacional. Mas fora do colegiado, não temos esse controle", diz. "Você é um poeta que mora nos cafundó do sertão, você vai estar preocupado com Biblioteca Nacional? Você está preocupado em ler o folheto para os amigos na feira", argumenta.
Ele estima que no Brasil existam 40 mil títulos de cordéis entre acervos particulares e de entidades, um dos maiores pertencente à própria ABLC, com 13 mil títulos, seguida da Fundação Casa de Rui Barbosa (RJ), 9 mil; Centro Nacional de Folclore e Cultura Popular (RJ); 8,9 mil; e a Fundação Joaquim Nabuco, com 7.3 mil.
Investimento
Editor e autor de literatura de cordel, o cearense Klévisson Viana, considera importante este tipo de ação vinda da BN. "Nunca tivemos a preocupação de mandar nosso material. E o nosso catálogo gira em torno de 300 obras. Toda semana a gente publica três ou quatro títulos", diz. Para ele, no entanto, é preciso mais empenho por parte da BN e sugere que a entidade abra vias de debate com os cordelistas para explicar a lei e a importância da catalogação. "Acho que os autores não se sentem motivados em mandar porque ninguém vive de vaidade. É importantíssimo que essa obra esteja catalogada, mas porque não levantar o que existe de produção e comprar? Eu não teria problema de doar um exemplar, mas sei de muitos poetas que vivem em situação difícil e, pra eles, isso é irrelevante", aponta.
Klévisson cita ações de várias entidades no sentido de criar acervos, como o das universidades de Osaka, no Japão, que constantemente adquire novas publicações, e Havard, nos EUA, que enviou recentemente duas bibliotecárias para pesquisar e comprar acervos. O Centro Cultural Banco do Nordeste montou também recentemente quatro acervos para disponibilizar ao público em suas sedes de Fortaleza, Crato, Souza (PB) e outra no novo centro que funcionará em Teresina (PI).
"A fundação Biblioteca Nacional está querendo correr atrás do lucro, porque ninguém corre atrás do prejuízo. Pode ser que eu esteja equivocado, que a minha visão seja miúda, tacanha. Talvez seja necessário que isso seja melhor divulgado e esclarecido", conclui o artista.
Depósito Legal
O Depósito Legal é regulamentado pelas leis N. 10.994, de 2004 e 12.192, de 2010, obrigando remessa à Biblioteca Nacional de um exemplar de todas as publicações produzidas em território nacional. As obras passam a integrar a Coleção Memória Nacional, tendo, assim, asseguradas sua guarda e difusão. Além de livros e folhetos de cordéis, estão inclusos os discos e DVDs de apresentações musicais. Entre as publicações que estão isentas da obrigação estão monografias e teses universitárias, material publicitário, calendários, agendas, etc. Ao publicar uma obra, o autor deve:
- Reservar no mínimo um exemplar para o acervo da Biblioteca Nacional
- Enviá-lo acompanhado de uma carta de apresentação para:
Biblioteca Nacional
Av. Rio Branco, n. 219/ 3. andar -
Centro, Rio de Janeiro, RJ. CEP: 20040.008
Mais informações: (21) 2220-1892 ou ddl@bn.br

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