Autoria: Liliana Borges.
Fonte: O Público. Data: 29/08/2016.
Os livros
são espalhados em diferentes locais da freguesia de Arroios e chegam aos 60
exemplares num só dia. Em bancos de jardins, esplanadas ou até piscinas
municipais, os livros procuram novas casas até dia 15 de Setembro.
Podem ser policiais ou histórias de amor.
Há quem prefira a poesia ou o fantástico, mas são poucos. Num mundo em que se
procuram pokémons e dominado pela hegemonia do online há uma freguesia em
Lisboa que quer colocar os moradores a caçar livros. Para isso, até 15 de
Setembro, a Biblioteca de S. Lázaro e a Junta de Freguesia de Arroios unem-se
numa iniciativa que pretende distribuir gratuitamente 2500 livros pelas ruas
até ao próximo dia 15 de Setembro. A selecção é feita com base nos
critérios de catalogação exigidos e com base no seu estado de conservação, no
tipo de literatura em que se inserem e nos anos da edição do livro.
A ideia de oferecer livros não
é pioneira, mas é a primeira vez que os livros são colocados na rua, conta ao
PÚBLICO Joaquina Pereira, uma das coordenadoras do projecto e responsável pela
biblioteca. "Queremos que as pessoas percam o medo que têm dos livros. Em
anos anteriores fazíamos a iniciativa aqui na própria biblioteca, mas não eram
muitas as pessoas que aqui vinham buscar. Ou por não saberem, ou por sentirem
vergonha", explica Joaquina.
Joaquina trabalha na biblioteca
há cerca de dois anos e meio. Durante este tempo, familiarizou-se com as
estantes por onde nos guia, enquanto explica a disposição dos livros naquela
que é a biblioteca municipal mais antiga de Lisboa e fala-nos da biblioteca e
dos seus visitantes. A menina dos seus olhos é a sala original, a sala de
leitura principal do edifício de arquitectura neoclássica erudita, inaugurada
em 1883, por Teófilo Ferreira, quando ainda se escrevia “Bibliotheca”. Aqui os
livros estão protegidos do tempo pelos vidros dos velhos armários de madeira.
No centro, um candeeiro de lustre marca o encontro entre as duas linhas de
mesas dispostas em dois círculos ao longo do espaço hexagonal, que se
preservou, mesmo
depois do encerramento entre 2000 e 2006 para requalificação da
biblioteca.
"Esta é a sala mais
antiga, que foi depois alargada a mais duas salas, a sala de estudo e a sala
infantil, mas quisemos manter tudo igual ao projecto original. Até o relógio de
parede é o mesmo ainda", conta orgulhosa. Entre as colecções constam
livros dos séculos XVII ao século XIX, sobre História de Portugal, sem esquecer
os Descobrimentos, a expansão e a colonização portuguesas, espanholas e
francesas, a Restauração de 1640, o Governo de Pombal e a implantação do
liberalismo.
No entanto, apesar da
qualidade da oferta, não são os livros de História os mais
procurados, adianta Joaquina. Os favoritos continuam a ser os policiais e
os romances. Segue-se depois a literatura erótica e só depois os infantis e
especializados. Os clássicos e a poesia são menos populares.
Para desafiar os hábitos de
leitura e até as preferências dos leitores, a equipa da biblioteca distribui
diariamente cerca de 50 a 60 livros pela freguesia. “Cada saco tem cerca de
duas dezenas de livros. Cada funcionário leva um ou dois sacos e procede à
distribuição. Tentamos espalhar por diferentes zonas da freguesia.” O jardim do
Torel, a zona do Saldanha e da Penha de França ou Estefânia são algumas das
zonas onde se podem encontrar os livros.
“Às vezes vamos encontrando os papéis que
distribuímos com o livro, mas não há sinal dele”, conta. “Ainda esta semana vi
alguém a ler um dos livros distribuídos, enquanto almoçava numa esplanada, o
que prova que as pessoas estão a aderir ao projecto”, conclui. “Muitas
vezes as pessoas intimidam-se e não conhecem os livros. Parece que os livros
assustam", analisa, descrevendo o projecto como uma forma de atrair novos
leitores, que não têm de ser moradores da freguesia. “Tem de haver um trabalho
que aposte em expandir os livros. Ler e conhecer mais livros traduz-se em mais
conhecer, mais informação. E as pessoas mais informadas são pessoas mais
livres”, sublinha.
Por isso, os livros saem da
biblioteca e podem ser encontrados em bancos de jardim, cafés, quiosques. São
sinalizados com um panfleto que contextualiza a iniciativa Leva-me Contigo e
que convida o leitor a conhecer as instalações que são a casa de mais de 20 mil
livros, entre os quais se contam colecções únicas no país.
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