A solicitação era para
que a CAPES divulgasse as planilhas com os componentes da avaliação
Qualis periódicos de todas as áreas – conforme pode ser visto neste e neste
outro post. Cada uma das 24 coordenações
de área do órgão é responsável por estabelecer os critérios que definem a nota
dos periódicos onde é publicizada a ciência produzida no Brasil. Essa nota tem
um papel fundamental para a avaliação acadêmica, pois é a partir dela que se
mede a produtividade, se avaliam pesquisadores e programas de pós-graduação e
se distribuem verbas e bolsas. Ademais, a nota QUALIS está diretamente
relacionada às relações de poder estabelecidas entre aqueles que controlam os
canais de comunicação científica e a comunidade científica de modo geral.
Atualmente os critérios
para se estabelecer as notas dos periódicos são definidos sem qualquer processo
de consulta pública à comunidade acadêmica. Embora os critérios sejam expostos,
com grau de detalhamento variável, pelas coordenações de área, eles não podem
ser auditados em sua aplicação. A mesma se dá às escuras: não se conhece tais
planilhas ou mesmo se elas existem. Isso dá margem a suspeitas sobre a
influência de interesses políticos, uma vez que essa avaliação tem fortes
implicações na carreira de pesquisadores, no êxito de grupos de pesquisa e
programas de pós-graduação, no sucesso comercial de editoras científicas e se
relaciona ao acesso a recursos públicos oferecidos à ciência brasileira. A
abertura desses documentos – que não estão sujeitos a qualquer situação de
sigilo prevista pela Lei de Acesso à Informação (LAI) – é fundamental para que
o processo possa vir a luz e ficar disponível ao escrutínio público.
A CGU demorou cerca
de 20 meses para decidir, sendo que em maio de 2013, o presidente da CGU tinha
determinado que a CAPES disponibilizasse tais dados.
Na resposta final da CGU,
afirma-se que:
“A CGU
buscou organizar reunião com a participação do cidadão e dos representantes da
CAPES de modo a possibilitar compreender o processo de avaliação do sistema
Qualis.” (23480.020334/2012-91, despacho de arquivamento).
Cabe observar que em nenhum momento
o solicitante foi procurado pela CGU para tal encontro.
O parecer surpreendentemente afirma
que se “constatou não existirem documentos além daqueles já entregues ao
cidadão” – cabe dizer que a CAPES não entregou NADA do solicitado – e pede que
o órgão passe a produzir e divulgar tais documentos:
“Por
meio do Relatório de Auditoria no 201407745, a SFC constatou não existirem
documentos além daqueles já entregues ao cidadão e recomendou à entidade
aprimorar seus procedimentos de transparência no âmbito do Qualis, produzindo e
divulgando em seu site documentos que demonstrem de forma detalhada a utilização
dos indicadores previstos na metodologia (quantitativos e qualitativos) de modo
a deixar claro como a comissão chegou à classificação dos periódicos.”
O relatório da
“auditoria” da CGU tampouco foi disponibilizado pelo órgão, embora numa das respostas
tivessem indicado que o documento estaria disponível no link http://sistemas.cgu.gov.br/relats/relatorios.php. Em busca no site da CGU, é possível localizar apenas
relatório de auditoria de contas no órgão.
As Informações existem ou não existem?
Se as informações sobre
como são aplicados os critérios não existem, então todo o sistema QUALIS de
avaliação da qualidade da produção científica brasileira seria um gigantesco
castelo de cartas? Se confirmado, esse complexo simulacro serviria para
escamotear trocas de interesses pessoais e coletivas envolvendo imensos
recursos públicos, de modo a torná-los imunes a qualquer auditoria. E se não
existem registros públicos, estamos em face de um escândalo de proporções
gigantescas.
Caso essas informações
existam, a CGU como órgão de controle deixou de cumprir seu papel, mostrando
não possuir nem força nem independência para fazer valer a lei.
Arquivamento do pedido
A conclusão do relatório,
é pelo arquivamento do pedido:
“Por
todo o exposto, opina-se pelo arquivamento do processo em epígrafe, haja vista
inexistirem documentos adicionais a ser fornecidos ao cidadão, razão pela qual
não merece prosperar a denúncia de
descumprimento de decisão apresentada.”
Com o “arquivamento” do pedido, a
CGU manda para sua gaveta uma solicitação que atendia não apenas àqueles que
defendem uma ciência aberta e transparente, mas ao interesse maior da sociedade
brasileira, que é a ética na gestão pública.
Cabe dizer que com mais de dois
anos de lei e nenhuma punição por descumprimento da Lei de Acesso à Informação
(LAI), a CGU parece se apequenar cada vez mais, mostrando que não é um órgão
preparado para a importante função que lhe foi atribuída de zelar pelo
cumprimento da LAI junto ao Poder Executivo Federal.
Fonte: Blog do OKBR, em 24/02/2015.