Fonte: Educar para Crescer. Data: 8/04/2011.
Autor: Camilo Gomide.
A falta de hábito de leitura é um grave problema para os brasileiros. Pesquisas recentes mostram que a população do país vem lendo mais nos últimos anos, mas o percentual de leitores ainda é muito baixo (de acordo com o estudo Retratos da Leitura no Brasil, de 2008, 45 % da população estudada não leu nenhum livro nos últimos 3 meses, e é considerada não-leitor pela pesquisa).
Embora 67 % dos brasileiros saibam que existe uma biblioteca perto de seus lares, apenas 1 em cada 4 cidadãos as freqüentam, de acordo com o Retratos da Leitura. A má condição dos estabelecimentos é um dos principais fatores que contribuem para esse distanciamento do público. O Retratos da Leitura mostra que 20 % dos leitores do país não vão às bibliotecas por causa da precariedade dos estabelecimentos.
Prédios velhos, falta de acervo, verba curta, má administração, entre outros, são alguns dos motivos que afastam o público das bibliotecas, e, consequentemente, da leitura. Se os brasileiros leem pouco, uma das causas é certamente a falta de acesso que a população tem aos livros.
Fazer com que as bibliotecas tenham maior alcance e sejam disseminadoras do conhecimento é um desafio e tanto, mas, é possível, como mostram experiências bem-sucedidas pelo Brasil. Conheça a seguir algumas ações que contribuem para a valorização das bibliotecas e estimulam o prazer da leitura.
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Dados do Ministério da Cultura mostram que no Brasil existem 331 municípios que ainda não possuem bibliotecas. Pode parecer pouco, considerando o total de 5.562 municípios brasileiros, mas não é. Se a cidade de São Paulo - com mais de 50 bibliotecas públicas - ainda possui áreas carentes de bibliotecas (caso das zonas sul e leste) imagine o problema que é ter acesso a livros no resto do Brasil?
Na impossibilidade de construir novas unidades, uma boa opção são as bibliotecas itinerantes, como a Biblioteca Volante e o Ônibus Biblioteca (também ganhadoras do Prêmio Viva Leitura 2008, na categoria Bibliotecas públicas, privadas ou comunitárias), das capitais de Rio de Janeiro e São Paulo, respectivamente.
"O ônibus biblioteca tem uma frequência altíssima. As comunidades que não têm bibliotecas por perto sentem muita falta disso, e quando chega o ônibus a procura é alta", diz Maria Zenita Monteiro, Coordenadora do Sistema Municipal de Bibliotecas do município de São Paulo.
Há ainda uma variação inusitada e bem regional das bibliotecas itinerantes: o jegue-livro. Em algumas cidadezinhas do nordeste, como Panelas (PE) e Alto Alegre do Pindaré (MA), livros para empréstimo são levados à população no lombo de um jegue. "O jegue é um bichinho simpático e faz uma boa propaganda. A população adora", diz Christine Fontelles, diretora do Instituto Ecofuturo, que ajuda comunidades a montar sua própria biblioteca. Ela conheceu o projeto na cidade de Panelas.
O ambiente da biblioteca tem de ser agradável para atrair as pessoas. Além de oferecer condições básicas de higiene e segurança, o espaço precisa ser confortável. Quanto mais lúdico for o contato com a biblioteca, maior é o aproveitamento do público.
Christine Fontelles, diretora do Ecofuturo, instituto que coordena o projeto das Bibliotecas Comunitárias Ler é Preciso, concorda com essa percepção. "Incentivamos que o ambiente das bibliotecas comunitárias seja um ambiente animado, colorido e bem iluminado", explica.
Se mantiver um aspecto sisudo, a biblioteca dificilmente será aproveitada pela comunidade. "Ela não pode ser apenas um armazém de livro", alerta Christine.
A Biblioteca Infantil Monteiro Lobato, na cidade de São Paulo, também segue esse modelo mais despojado (que vem sendo implementado na maioria das bibliotecas do município). Além de salas com poltronas, pufs e tapetes para as crianças deitarem, a Monteiro Lobato conta com uma atração que poucas têm: um parque. O playground é da prefeitura, mas fica no quintal do prédio da Monteiro Lobato e é bastante freqüentado pelo público da biblioteca.
Nenhum obstáculo deve existir entre os livros e o público em uma biblioteca. "O importante na biblioteca são os livros. O livro é um objeto de mediação entre o conhecimento e o sujeito, nada deve ser posto entre eles", defende Christine Fontelles, diretora do Instituto Ecofuturo.
Christine também afirma que é preciso ter cuidado com a disposição e exposição das obras. "Para as crianças, por exemplo, as estantes precisam ser baixas e os livros tem de estar com a capa sempre voltada para a frente", diz.
Outra medida importante é ter profissionais capacitados para melhor atender o público. O bibliotecário deve estar presente para auxiliar e não dificultar o acesso aos livros. "Os profissionais que trabalham nesses espaços precisam compreender a relação do leitor com os livros. A pessoa que faz a mediação entre leitor e livro precisa ser leitora também, para saber como atrair o público. Um pouco de carisma também ajuda. Não adianta ter um espaço bonito com uma pessoa carrancuda te atendendo", diz Rovilson José da Silva, diretor de bibliotecas de Londrina (PR) e responsável pelo "Projeto de Leitura Bibliotecas Escolares: Palavras Andantes", ganhador do Prêmio Viva Leitura 2008, na categoria Escolas Públicas e Privadas.
Os itens mais importantes das bibliotecas são, naturalmente, os livros. Portanto, além de ter um bom acervo é necessário conservá-lo. Nas Bibliotecas Comunitárias Ler é Preciso - parceria entre o Instituto Ecofuturo e a Fundação Nacional do Livro Infantil e Juvenil (FNLIJ) -, por exemplo, parte do treinamento dos bibliotecários é dedicada às práticas de conservação das obras. A diretora do programa, Christine Fontelles, explica que o bibliotecário tem de estar preparado para ensinar o público como tratar os livros. "Em algumas regiões extremamente pobres, faltam noções de cuidado. As crianças manuseiam os livros de qualquer jeito e isso pode danificar as obras.", diz.
O projeto de leitura Bibliotecas Escolares: Palavras Andantes, de Londrina (PR), segue filosofia semelhante, e, além da capacitação dos profissionais (um dos pontos fortes do programa), busca a melhoria constante dos acervos das bibliotecas escolares. "A biblioteca é um lugar de troca e convivência. Para que ela não perca esse caráter, é preciso investir na ampliação contínua do acervo", diz Rovilson José da Silva, diretor de bibliotecas de Londrina (PR).
A pesquisa Retratos da Leitura no Brasil 2008 apontou que mais da metade dos frequentadores das bibliotecas são crianças e adolescentes. Ler é bom para todos, mas é ainda mais importante no aprendizado durante a infância e adolescência. As bibliotecas precisam ter espaços voltados para esse público para atraí-lo e atendê-lo com qualidade.
Além de salas confortáveis, coloridas, bem iluminadas e limpas, é preciso ter acervo e programação específicos para esse público. "Temos um acervo muito grande de gibis, quadrinhos, DVD`s e livros infanto-juvenis. Também promovemos exibições de filmes e seções de contação de histórias, que atraem bastante os jovens", diz Rita Pisniski, diretora da Biblioteca Infantil Monteiro Lobato, da cidade de São Paulo.
O diretor de bibliotecas de Londrina, Rovilson José da Silva - responsável pelo Projeto de Leitura Bibliotecas Escolares: Palavras Andantes, vencedor do Prêmio Viva Leitura 2008, na categoria Escolas Públicas e Privadas - dá a dica: "Quando a criança vir a biblioteca ela tem de se sentir atraída. A biblioteca tem de ser um espaço adequado e educativo para a criança e estar integrada à visão de ensino e aprendizagem das escolas", diz.
Hoje, internet, televisão e videogames competem com os livros. Por isso, as bibliotecas precisam oferecer algo além dos livros nas estantes. Seções de leitura e de cinema, contação de histórias para crianças, telecentros, teatro, oficinas, entre outros, são algumas das opções para tornar a biblioteca um ambiente mais atrativo para jovens leitores. A biblioteca Infantil Monteiro Lobato, por exemplo, tem um grupo de teatro, o TIMOL (Teatro Infantil Monteiro Lobato), feito pelas crianças e jovens que a frequentam. A diretora Rita Pisniski garante ser um sucesso. "A princípio, o Timol é para crianças e jovens dos 10 aos 18 anos. Mas, muitos, quando ficam mais velhos, gostam tanto que não querem ir embora. Acabam ficando para fazer direção, figurino, cenografia, essas coisas e deixam a encenação para os mais novos", diverte-se a diretora.
A biblioteca tem de funcionar de acordo com a necessidade do público que a freqüenta. Para isso, é preciso se adequar aos horários em que os usuários têm maior disponibilidade para visitar as bibliotecas. Em sua reformulação pedagógica, o Palavras Andantes, de Londrina, fez com que a maioria das bibliotecas das 80 escolas do município permanecessem abertas para leituras e empréstimos durante o horário de recreio. Do que adiantaria uma biblioteca escolar fechada no único período em que a criança não está em sala de aula, não é mesmo?
Outro problema na maioria das cidades é a falta de bibliotecas abertas aos domingos. Em Belo Horizonte nenhuma biblioteca pública abre nesse dia, Em São Paulo , apenas quatro, das mais de 50, e no Rio de Janeiro seis das 29 bibliotecas públicas funcionam aos domingos. O número reduzido de funcionários e a falta de pagamento da prefeitura por horas extras de trabalho costumam ser os maiores obstáculos na hora de funcionar aos domingos. Mas, se existe procura da população pelas bibliotecas aos domingos é possível atendê-la, mesmo com tantos empecilhos.
A Biblioteca Infantil Monteiro Lobato, uma das quatro bibliotecas que atendem aos domingos na cidade de São Paulo, funciona graças ao esforço de seus funcionários. "Para funcionar aos domingos não precisamos de todos os funcionários, apenas alguns. Para não sobrecarregá-los fazemos um rodízio", explica a diretora Rita Pisniski. O atendimento no fim de semana não é igual ao dos dias úteis: funcionam apenas a sala de leitura e a Gibiteca, em horário reduzido, das 10h as 14h. "Mas se alguém precisar muito usar a sala de pesquisa a gente dá um jeito", diz Rita.
Boas bibliotecas são feitas por e para a população das cidades onde funcionam. Para atender as verdadeiras necessidades do público, nada melhor do que envolver a comunidade em todo o processo de criação das bibliotecas. Se a comunidade participar da escolha das obras, da decoração do ambiente, da programação das oficinas, etc, as bibliotecas serão mais envolventes e terão a cara do público que as frequenta. É o que acontece nas Bibliotecas Comunitárias, do Programa Ler é Preciso, do Instituto Ecofuturo. "A participação da comunidade é fundamental. São as pessoas que têm de escolher quais gêneros a comunidade precisa. É muito importante compartilhar com a comunidade todo o processo das bibliotecas.", diz Christine Fontelles, diretora do programa.
Christine também destaca a importância da comunidade se engajar para conseguir maior representatividade política. "Nosso programa visa potencializar projetos de leitura já existentes. A participação da comunidade é fundamental para conseguir o apoio da prefeitura e do Estado. Em Mogi das Cruzes, por exemplo, graças ao engajamento, a população conseguiu apoio do Instituto C&A e do Ministério da Cultura para a melhoria de uma das bibliotecas comunitárias", diz a diretora.
De acordo com a pesquisa "Retratos da Leitura no Brasil", de 2008, 3 em cada 4 brasileiros não vão às bibliotecas. O número é assustador. Uma das principais causas dessa baixa frequência pode ser a falta de informação sobre os estabelecimentos. "A maior fragilidade das bibliotecas é a divulgação. Tem muita biblioteca na cidade de São Paulo que existe há anos e a população não sabe de sua existência. Trabalhamos muito infraestrutura e acervo, mas temos que trabalhar mais a divulgação nos bairros", afirma a Coordenadora do Sistema Municipal de Bibliotecas do município de São Paulo, Maria Zenita Monteiro.
Na impossibilidade de construir bibliotecas para atender a todos, ou de abrir todas as unidades aos domingos, é preciso procurar outras formas de atender ao público. Livros pendurados em árvores, leituras no bosque, e até mesmo o Jegue-livro, vale tudo para estimular a leitura.
A Secretaria Municipal de Cultura de São Paulo conta com seis pontos de leituras em parques da cidade, conhecidos como "Bosque da Leitura". Ao todo, são seis unidades nos parques do Ibirapuera, Piqueri, do Carmo, da Consolação, do Anhanguera e no parque da Luz. Todos funcionam aos domingos.
Em algumas cidades do Nordeste, a criatividade dos moradores para incentivar a leitura vai além de atividades nas praças e do jegue-livro: alguns chegam a pendurar livros nos galhos de uma árvore para divulgar a biblioteca, como acontece na Biblioteca Comunitária Ler é Preciso em Barroso, MG. "Algumas pessoas, por conta própria, reúnem e fazem ofertas de livros o que valoriza muito a leitura. E é assim que deve ser, pois a biblioteca é um meio de encantamento", diz Christine Fontelles, diretora do Instituto Ecofuturo.
Ter acesso a livros é fundamental na idade escolar, não apenas para pesquisas, mas para o desenvolvimento de habilidades relacionadas à leitura e para a formação de futuros leitores. Portanto, é preciso fazer com que as bibliotecas das escolas tenham bom acervo, infraestrutura adequada e atendimento de qualidade.
Desde 2002, a prefeitura de Londrina (PR) vem investindo nas bibliotecas das escolas do município por meio do projeto de leitura Bibliotecas Escolares: Palavras Andantes, vencedor do Prêmio Viva Leitura, que visa reconhecer as melhores experiências de estímulo à leitura no Brasil. A premiação da iniciativa de Londrina ocorreu em 2008, na categoria de Escolas Públicas e Privadas.
O programa Palavras Andantes, que tem como principal meta estimular a leitura entre os alunos, passa por quatro eixos fundamentais: a formação do mediador de leitura (bibliotecário ou professor); a instituição do horário de leitura em todas as escolas; a reorganização arquitetônica da biblioteca (organizar e reformar o espaço: pintar as paredes com cores agradáveis, colocar cadeiras e mesas adequadas para crianças, etc) e a ampliação contínua dos acervos.
"Não acredito em processo de aprendizagem que não tenha como centro a biblioteca. A biblioteca é uma representação da história da humanidade, do conhecimento artístico, histórico e literário. Se não valorizarmos esse arcabouço humano, que tipo de Educação estaremos oferecendo?", questiona Rovilson José da Silva, diretor de bibliotecas do município de Londrina.
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