Autor:
Diogo Guedes.
Fonte: Jornal do Commercio (Recife, PE). Data:
15/12/2012.
URL:
http://jconline.ne10.uol.com.br/canal/cultura/literatura/noticia/2012/12/15/biblioteca-alvaro-lins-guarda-acervo-pessoal-do-escritor-66917.php
Álvaro
Lins (1912-1970) só viveu 12 anos na sua terra natal, mas deixou para ela um
legado de imenso valor. O filho ilustre da Princesa do Agreste morou pelo resto
da sua vida no Recife, no Rio de Janeiro e em Lisboa, em Portugal, mas nunca
esqueceu as origens no interior de Pernambuco. Tanto que, depois da sua morte,
em 1970, a sua família decidiu doar uma grande parte dos seus imensos acervos
de livros para o município.
O
problema é que os milhares de livros – uns dizem mais de 4 mil títulos, outros
8 mil – ficaram por muito tempo jogados, sem receber qualquer cuidado ou
análise. O primeiro espaço a receber a doação foi a Casa da Cultura José Condé,
no Parque 18 de Maio. Depois, os livros foram levados para Estação Ferroviária
da cidade. Ali, o descaso com as obras se agravou: o espaço não tinha condições
de receber os livros e muitos foram danificados e até se perderam no depósito.
Hoje,
as obras ganharam uma sala própria na Biblioteca Municipal Álvaro Lins, no
bairro do Centro. Apesar da fachada do local parecer bastante com a de uma casa
comum, estão lá cerca de 4,8 mil títulos da biblioteca original do “imperador
da crítica brasileira”, como o chamou Carlos Drummond de Andrade. A sala é
apertada para a quantidade de livros, mas pelo menos agora as obras são
armazenadas em uma sala com a refrigeração necessária.
Segundo
Antonio Ferreira, gestor da Biblioteca Álvaro Lins, os livros ainda passaram
por um processo de higienização durante este ano, fruto de um treinamento feito
com técnicos da Biblioteca Nacional. “Estamos tentando procurar parte do resto
do acervo de Álvaro Lins para adquiri-los”, conta o gestor.
ACERVO
A
biblioteca pessoal de Álvaro reúne obras de importância histórica para a
literatura, além de diversas obras de interesse público. Estão lá as primeiras
edições de livros de autores como Drummond, José Lins do Rego e João Guimarães
Rosa, várias delas com dedicatórias exclusivas feitas ao caruaruense. A
Biblioteca ainda fez um esforço para reunir uma pequena parte dos títulos
publicados por Álvaro Lins.
Apesar
do tratamento e higienização, os livros não ganharam uma organização própria:
estão divididos apenas entre os exemplares de coleção, os em idioma
estrangeiro, os de crítica literária e os de literatura. Há, no entanto,
títulos que são representativos da vida de Álvaro Lins e também da forma como
ele (e o seus amigos) não misturava a amizade com a crítica literária.
Um
exemplo é a coleção com três volumes (e quatro tomos) A literatura no
Brasil, escrita pelo desafeto de Álvaro Lins, o professor e acadêmico
Afrânio Coutinho. Desde 1943, Afrânio passou a atacar a crítica de rodapé em
defesa de parâmetros científicos para a literatura, citando diversas vezes
Álvaro Lins como seu pior exemplo. Lins pouco respondeu, mas acusou Afrânio de
estar magoado com a recepção crítica de um de seus livros. No acervo, é
possível encontrar a coleção, lançada em 1956, com dedicatórias pomposas em
cada um dos tomos para o crítico literário caruaruense.
Outro
volume curioso é um enviado por Clarice Lispector. Álvaro já havia escrito
sobre a autora na sua estreia, Perto do coração selvagem, chamando o
livro de “experiência incompleta”. Clarice aparentemente não ficou magoada com
o comentário pesado: mandou para ele uma cópia de A legião estrangeira,
com a simples mensagem: “A Álvaro Lins, homenagem de Clarice Lispector”.
Respeito a um crítico que não confundia amizades com o trabalho e era sempre
elegante, mesmo para comentários negativos.
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