Autoria: Guilherme Freitas.
Fonte:
O Globo. Data: 17/12/2015.
O escritor e professor carioca
Domício Proença Filho, de 79 anos, assume nesta quinta-feira a presidência da
Academia Brasileira de Letras (ABL) preocupado com os possíveis efeitos da
crise econômica sobre os programas da instituição, mas determinado a ampliar a
atuação da casa na promoção da leitura e da língua portuguesa. A cerimônia de
posse começa às 17h no Salão Nobre do Petit Trianon, no Centro.
Ocupante da cadeira 28 desde 2006,
Proença avalia que a crise pode ter impacto sobre os aluguéis de imóveis da
ABL, principal fonte de renda da instituição. Promete não cancelar nenhum dos
projetos realizados pela casa, como o seminário “Brasil, brasis”, as
publicações e os ciclos de música clássica e popular. Mas diz que alguns deles
podem ter que sofrer reduções, como as leituras dramatizadas e o financiamento
de coedições.
— A ABL é uma instituição sem fins
lucrativos, que vive dos aluguéis de seus imóveis. Uma crise tem reflexos
nisso. Felizmente, temos uma reserva que nos dá tranquilidade, mas nos obriga a
ter prudência. Não vamos acabar com nenhum programa, mas podemos ter que
adequar alguns à realidade da crise. A sociedade nos conferiu uma aura de
instituição representativa da cultura brasileira. Nosso desafio é manter isso —
diz Proença
A crise econômica afetou o mercado
editorial e projetos de incentivo à leitura neste ano. Proença cita como
exemplos disso os cortes em programas federais de compras de livros, que
tiveram impacto nas editoras, e o cancelamento da edição de 2015 da Jornada
Nacional de Literatura de Passo Fundo (RS), tradicional evento que tinha um
braço dedicado ao público infanto-juvenil. Para o novo presidente, esse cenário
reforça a importância do papel da ABL na difusão da língua portuguesa e da
leitura.
— A importância da leitura deveria
ser evidente, mas é necessário defendê-la, porque o livro ainda é visto como
supérfluo no Brasil. Uma cláusula pétrea em nosso estatuto diz que o objetivo
primeiro da Academia é o culto da língua e da literatura nacional. Isso já é
feito, mas pretendemos dar ainda mais força a esse aspecto, com debates,
pesquisa e divulgação — diz Proença, eleito para mandato de um ano, por
unanimidade, como é tradição na ABL, em chapa que inclui Nélida Piñon,
secretária-geral, Ana Maria Machado, primeira-secretária, e o colunista do
GLOBO Merval Pereira, segundo-secretário.
Parte deste trabalho de “culto” do
idioma está relacionado à implantação do Acordo Ortográfico, que entra em vigor
oficialmente no Brasil em 1º de janeiro de 2016. Depois de anos de críticas e
adiamentos, Portugal adotou o acordo em maio de 2015, mas as novas regras ainda
são criticadas no país europeu. A ABL teve participação ativa na difusão do
acordo no Brasil e chegou a criar um aplicativo gratuito com o novo vocabulário
ortográfico.
Para Proença, as polêmicas sobre o
acordo serão superadas.
— O acordo tem uma dimensão
linguística, mas é também um fato politico, que pretende unir os povos
lusófonos. Isso tem uma série de vantagens, com divergências naturais, porque a
língua envolve paixões. O Brasil fez mais concessões do que Portugal, que
acabou reagindo com mais ênfase contra o acordo. Mas desde maio ele foi
plenamente adotado lá. E aqui, mesmo antes do prazo oficial, já havia sido
abraçado por escolas, editoras e imprensa. O acordo só muda a roupa das
palavras. A língua continua tal como ela é e vai continuar mudando a partir da
dinâmica da sociedade e da cultura.
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