Fonte: Portal Vermelho. Data: 19/01/2014.
URL:
www.vermelho.org.br/noticia.php?id_noticia=233822
"Somos inacabados e a leitura ameniza e intensifica
isso" - inicio com as palavras do professor e velho amigo de batalhas,
Oswaldo Almeida Junior, e adianto: não tenho uma nova fórmula para solucionar
as deficiências da área de leitura, da formação de leitores no Brasil, o que
trago aqui são ponderações muito específicas, com todos os limites que elas
carregam.
Por Ricardo Queiroz Pinheiro, em seu blog*
Começo com os
reflexos das palavras iniciais: amenizar e intensificar. Elas não são apenas a
representação do ato solitário de ler, elas pode ser utilizadas sem vaticínios
na dimensão pública do universo da leitura, daí passam a abarcar o coletivo e
vai além do ato exclusivo e isolado do leitor.
E quando nos
referimos à leitura, a história nos fornece registros desse ir e vir entre o
individual e o coletivo, as histórias compartilhadas em registros diversos, de
início na memória, no boca a boca, para logo após se massificar e ironicamente
passar a ser ato isolado por conta das novas técnicas.
Desloco rápido,
o pensamento para o ano de 2003, Brasil quando foi implantada a "Lei do
Livro", resumindo suas intenções e implicações, em tese ela incide
diretamente na desoneração e no consequente barateamento do objeto livro,
contiguo a isso foi instituído um Fundo suprido por 1% das vendas de livros no
país que seria depositado pelo mercado editorial e utilizado nas políticas
públicas de fomento à leitura.
Pincei um
exemplo e deixo um hiato para que pensemos...
Dez anos e
alguns meses depois e o preço médio de capa do livro não sofreu os efeitos
dessa desoneração, continua caro e elitizado, e o referido fundo segue tímido
atolado no descumprimento da lei e nesse sentimento naturalizado de que ignorar
regras é um comportamento aceitável.
Por que o
mercado editorial e a cadeia do livro ignorou a referida Lei 11.030, ela tem
falhas, ela substimou as regras do mercado, ela não foi pactuada a contexto Ela
não serve para a conjuntura Reconhecer uma contradição e dissecá-la é o
primeiro passo para intervir e modificar uma realidade, mas há real interesse A
ver.
O livro é um
objeto unânime, tirante as patologias históricas que mais pelo seus conteúdos,
subjetividade e eventual transgressão do que pela forma, o demoniza e o destrói
em certas conjunturas, ele é visto de forma positiva pela sociedade. Ler é
"virtude" não assumida, é bom sempre para o "outro",
podemos dizer que existe um certo cinismo nos discursos de apologia aos
benefícios da leitura.
O ato da leitura
não implica necessariamente nesse prazer desprendido e cheio de leveza, leitura
é hábito, e antes de tudo, é hábito que se adquire arduamente, depende de
trabalho, depende de esforço e dedicação. E é nesse aspecto que a apologia
fácil se torna falsa, quem a profere, quem a repete assume que a leitura
depende desse dispêndio de energia, de disciplina ou apenas joga palavras ao
vento para reforçar um falso consenso?
O fato é que
essa retórica, essa ladainha incide diretamente nas políticas públicas e nos
marcos legais do livro e da leitura, a roupagem do lúdico, do prazeiroso, do
frugal encobre a dura realidade do universo leitor, palavras lindas e leves não
resolvem as questões da democratização, acesso e circulação, e acaba acomodando
tudo na seara das boas intenções e se adia reiteradamente para um constante
amanhã.
Outro fator
inexorável: a leitura tem um custo material, e o custo nela embutido está
implicado diretamente no preço de capa do livro e no custeio do universo do
livro e leitura (industria, profissionais, maquina pública etc), nesse baile
circula o público e o privado - muitas vezes com seus papéis distorcidos e
misturados, como é de costume nessa realidade de ideologias difusas - no topo
dessa torre de babel é decidido o rumo dos recursos públicos aplicados.
Volto então aos
verbos do Oswaldo (desculpem a banalização das palavras do amigo), amenizar,
sim, amenizar com leis e ações práticas, mas nunca esquecer que a
intensificação das cobranças, dos resultados e das consequencias nos mostram um
quadro praticamente inalterado na democratização da leitura. As leis, os
divisores de água, os marcos legais fazem aniversário como tudo, e nesse caso,
o que nos cabe é comemorar com cobrança.
E quem convocar
para fazer a devida cobrança das leis não cumpridas? Quem encabeça a lista:
bibliotecários, professores, escritores (principalmente os "não
contemplados"), leitores, como juntar pessoas e mesmo grupos que agem
isolados?
O ano de 2014 é
ano de eleição no nível federal e estadual, ano de rediscutir as políticas
públicas e as prioridades em todas as áreas, uma boa oportunidade para avaliar
o que é real, o que é promessa, o que é de fato, o que é discurso, o que é
leve, o que é pesado. Como disse acima, leitura dá trabalho e exige dedicação e
empenho, momento de unir o ameno ao intenso e dar rumo a essa prosa solta.
*Blog Klaxon SBC
Nenhum comentário:
Postar um comentário