Fonte: Jornal de Brasília. Data: 26/02/2016.
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www.jornaldebrasilia.com.br/noticias/cidades/669532/biblioteca-publica-recebe-pagamento-com-tampinhas-para-incentivar-leitura/
Na Biblioteca Pública do Itapoã, a moeda é uma tampinha de garrafa PET;
a mercadoria é um livro; e o valor e o lucro são o conhecimento adquirido. Na
região administrativa — localizada há aproximadamente 25 quilômetros da
Rodoviária do Plano Piloto — com 20 tampinhas é possível ganhar um livro.
Estima-se que, em um mês, 500 obras foram negociadas pelo sistema de barganha.
Quanto mais pessoas buscam por exemplares, mais se deseja fornecer.
O escambo literário começou com a união de dois projetos: Tampa Mania
(doações de tampas) e Livro por Livro (troca de um livro por outro). Ambos
foram idealizados pelas funcionárias da administração regional que comandam o
acervo e o público, Rozângela Rodrigues da Silva, de 49 anos, e Lilia Valéria
Correa, de 40 anos. "O que a gente mais quer é ver isso aqui cheio",
afirma Rozângela ao apontar para as cadeiras de estudo.
As duas começaram a exercer a função de bibliotecária no segundo
semestre do ano passado e sem terem experiência no ramo. Foi da simples vontade
de que o espaço servisse como um ambiente de socialização para as crianças e os
adolescentes da região. "O Itapoã é uma área de vulnerabilidade, temos que
estar atentos com as crianças nas ruas", justifica Lilia.
Essa é uma das principais preocupações dela. A funcionária conta que é
ex-presidiária e até 2008 esteve na Colmeia (prisão feminina do Distrito
Federal). Hoje, estuda direito em uma faculdade particular de Brasília e sonha
ser promotora.
Segundo Lilia, o objetivo de incentivar a leitura é reduzir a
possibilidade de influências negativas para as crianças do local. Ela explica
que a barganha não é com os exemplares do acervo, mas com volumes doados à
biblioteca com essa finalidade.
Incentivo
Além da troca, as funcionárias também desenvolvem oficinas de reciclagem
com as crianças. São brinquedos e enfeites construídos com CDs, garrafas PET e
outros produtos reutilizados. "Qualquer criança pode participar. É só ter
idade para usar a tesoura", brinca Rozângela. Com as ações, a biblioteca
passou a receber por volta de 30 frequentadores diariamente, inclusive de
familiares e de estudantes para concursos. Antes, a média era de cinco em um
dia.
Os trabalhos desenvolvidos no local ainda são novidade na região
administrativa, onde 68,96% da população não estudam e 44,3% têm ensino
fundamental incompleto. Os dados são da última Pesquisa Distrital por Amostra
de Domicílios do Itapoã divulgada em 2014, pela Companhia de Planejamento do
Distrito Federal. Os índices reforçam o desafio da administração para estimular
o hábito de ler, e as ações têm apresentado resultados positivos. "Isso
era morto aqui. Tinha até apostila de 1990 para o exame da Ordem dos Advogados
do Brasil", compara Lilia.
Segundo Rozângela, a cada 15 dias, as duas separam exemplares e levam ao
Restaurante Comunitário — vizinho à biblioteca — para divulgar o espaço.
"É sempre na sexta-feira, porque tem feijoada." Elas se vestem de
palhaço e adotam a alcunha de Lika (Lilia) e de Rosa Brilhante para chamar a
atenção de quem passa. Contam histórias e criam momentos lúdicos para a
criançada.
Família
As inovações deram certo. Há um mês, Ana Carolina Félix, de 10 anos, tem
sido uma frequentadora assídua da biblioteca. Ela conta que lê diariamente
cinco livros e ainda leva o irmão caçula, Guilherme, de 5 anos, como companhia.
Branca de Neve e os Sete Anões e Aventuras da Barbie são os livros preferidos da
garota, que vai à biblioteca no turno vespertino e já está preparada para mudar
o cronograma com a volta às aulas na próxima segunda-feira (29). "Aí, eu
venho de manhã", responde com um sorriso.
"As crianças trazem as famílias, que também gostam daqui. E assim a
biblioteca vai de boca em boca se espalhando pela cidade", acrescenta
Lilia. De fantasias e com flores nos nomes, Lilia e Rozângela tentam educar e
preparar os moradores do Itapõa para que os espinhos não sejam tão duros. (...)
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